O
que levou aquele rapaz a estar usando uma máquina de escrever? O que será que
estaria escrevendo e para quem? Porque
estava ali no quarto sentado na cama em vez de estar usando a escrivaninha? Tantas
perguntas que me vinham à cabeça ao ver uma coisa tão sem sentido.
Um
lugar de loucos aonde eu fui parar, mas também podia me considerar uma louca,
viciada, que arruinei a minha vida que já não prestava para nada mesmo. Já estou aqui a quarenta
e dois dias e acho que o pior já passou, mas meu corpo está tão fraco, sinto
dores em todos os lugares e nunca sei se o que estou vendo é real ou se estou
sonhando.
Coisas
estranhas aconteciam todos os dias que me deixavam sem reação. Vivia num mundo
onde as paredes pareciam ser transparentes e podia enxergar a todos dentro de
seus quartos. Sabia tudo e a minha mente não parava de pensar, os meus olhos
estavam sempre atentos ao mais simples movimento. Precisava dormir, mas o sono
não vinha e a noite era longa. Uma noite onde não estava sozinha porque muitos
também não conseguiam dormir.
O
som das teclas da máquina de escrever faziam eco no silêncio da noite. Era o
sinal de que muito o rapaz, do quarto ao lado, tinha para colocar naquele papel
e aquelas batidas estavam me deixando alucinada, minha cabeça parecia que ia
explodir. Queria correr lá e arrancar aquela máquina e quebrá-la toda, mas não
tinha forças para me levantar. O tempo ia passando e eu ainda estava de olhos
abertos, mas já não me perturbava muito o barulho que passou a me fazer companhia.
O
dia começava a clarear quando o toque da máquina parou. Fiquei naquele silêncio
e sem sentir devo ter adormecido.
Acordei desesperada com falta de ar e comecei a gritar para ver se
alguém vinha me ajudar. Tinha medo de abrir os olhos e ver que algo de muito
ruim tinha acontecido.
Estava
toda encolhida e tremendo de frio quando entraram pela porta do meu quarto.
Começaram a conversar comigo, mas eu não escutava nada do que diziam. Abriram
meus olhos, minha boca, colocaram uns aparelhos no meu peito, no meu braço e
depois tomei um remédio.
Gosto
quando fazem isso porque me sinto melhor e então posso sair para passear. Voltei lá no quarto do rapaz, mas ele não
estava mais lá e nem a máquina de escrever. Corri para perguntar ao enfermeiro
que estava no corredor e ele disse que não esteve ninguém naquele quarto e
muito menos escrevendo a máquina. Eu falei para ele que tinha visto e escutado
o toque a noite toda, mas ele falou que sonhei.
Eu
não podia estar ficando louca e tinha a certeza do que vi. Parecia até com meu
pai quando tinha que escrever algum artigo para o jornal. Era assim mesmo ele
ficava trabalhando a noite toda e lembro que muitas vezes a mamãe vinha dormir
comigo na minha cama. Eles sabiam que
estavam indo ao encontro da morte, impossível não saber.
Escutei baterem forte na
porta e então aqueles homens invadiram a nossa casa, começaram a bater no papai
e a gritar. Lembro que mamãe me escondeu debaixo da cama e pediu para eu ficar
quietinha. Fiquei com muito medo, mas a mamãe pediu para eu não sair e tinha
que obedecer. Escutei muito barulho, gritos e o choro da minha mamãe, mas
depois tudo ficou em silêncio e eu acabei pegando no sono. Quando acordei todos
já tinham ido embora. O homem me disse que eles foram ao encontro da morte e
não puderam me levar.
Vai ver que o rapaz também
estava escrevendo para o jornal e foi levar o que tinha escrito antes que os
homens ficassem bravos com ele. Espero que volte para poder
perguntar a ele. Agora vou aproveitar para descansar e dormir sem
escutar o toque da máquina de escrever.
Rs
115ª Edição Conto/História
Tema: "Eles sabiam que estavam indo ao
encontro da morte, impossível não saber"- Patrícia Cornwello
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